Nicanor de Freitas Filho
Minha cunhada trabalhava na USP, como Desenhista. Aliás,
ela é uma artista nata. Faz cada coisa linda! Ela tinha uma colega, que
trabalhava junto com ela, e eram muito amigas. Muitas vezes, para terminar um
serviço, ficavam até mais tarde, fazendo umas horas extras. Essa amiga morava
no Tucuruvi. Não era tão difícil para ela, porque tinha uma linha de ônibus
elétricos, que fazia exatamente USP x Tucuruvi. Então ela pegava este ônibus,
ia direto e parava bem perto de sua casa. Como sempre acontece, quando ela
entrava no ônibus, geralmente já conhecia alguma das pessoas que lá estavam,
incluindo motoristas e cobradores.
Um dia trabalharam até mais tarde um pouco e por volta
das 20 horas saíram juntas e cada uma tomou o seu ônibus. Ela entrou,
reconheceu dois ou três passageiros, passou pela roleta e assentou já perto da
porta de saída, num banco vazio, ou seja, os dois lugares vagos. Pôs a bolsa no
colo, e foi pensando na vida. O que tinha feito naquele dia, o que a esperava
em casa e o que poderia fazer no dia seguinte.
Totalmente absorta nos pensamentos, só percebeu que se
sentou alguém ao seu lado, porque esbarrou acintosamente nela, inclusive tocando-lhe
no braço. Ela olhou feio para ele e reparou que se tratava de pessoa realmente
mal-educada, não estava bem vestido e pensou consigo mesma: - deve ser um pobre
coitado, mas vou trocar de lugar, porque não gostei da cara dele.
Olhou, olhou não encontrou uma poltrona vazia e nestes
movimentos de olhar para frente e para trás, percebeu que seu relógio de pulso
havia “sumido”. E ela gostava muito dele, até por ter sido presente do
namorado. Então ela começou a ter um drama! Como reagir? O ônibus cheio, ela
pensou, vou gritar que ele roubou meu relógio, e o pessoal vai me ajudar! Mas é
um vexame! Pensou melhor e resolveu, deixa pra lá, não sou a primeira vítima de
roubo. Mas pensou, tenho que sair daqui nem que tenha que fazer o resto da
viagem em pé! Aí “doeu” de novo, o relógio dado pelo namorado... Que dúvida
cruel! Não sabia o que fazer e aquilo foi atormentando sua cabeça, até que ela
tomou uma decisão: o ônibus está cheio, vou reagir e se ele tentar me intimidar
mais sei que os demais passageiros vão me ajudar.
Resolvida, ela pegou dentro da bolsa, aquele pente com
cabo, passou-o por baixo do seu próprio braço, que segurava a bolsa, que ela
deixou aberta. Cutucou com o cabo fino do pente nas costelas do larápio, olhou
firme nos olhos dele e disse com voz enérgica e direta:
“ – Bota o relógio dentro da minha bolsa!” E não tirou os olhos dele. Olhava-o com raiva e
muita segurança! No que ele obedeceu e, provavelmente, para não ser linchado,
pensou ela, desceu do ônibus que estava parado no ponto. O motorista fechou a
porta e seguiu a viagem. Ela se sentiu aliviada, pois não só recuperara o
relógio, como o ladrão se intimidou com a reação forte dela e foi embora. Ufa!!
Chegando em casa ela contou para a Mãe o que havia
ocorrido e mostrou triunfante o relógio... que ela havia “roubado”. Sim! O
relógio não era o dela, era um relógio masculino! Ela não sabia o que fazer.
Será que o cara tinha trocado os relógios? Ou será que ele já tinha roubado
mais de um e se confundiu na hora da devolução?
Ela entendeu melhor o que houve, no dia seguinte, ao
chegar no escritório e encontrar o seu relógio dentro da gaveta da mesa de
trabalho!!!
Verdadeiramente, ela havia assaltado o pobre rapaz!!